Virgens Negras - Uma ponte do culto de Ísis ao culto Mariano
“Eu sou negra, mas sou bela, oh! Filhas de Jerusalém como tabernáculos do Cedar, como as tendas de Salomão”. Vers. 4o do cap. I do Cântico dos Cânticos
Desde os tempos primordiais a Humanidade tende a louvar o desconhecido, as forças da vida, os astros do céu, o fogo da terra, a água dos rios e dos mares, os ventos que sopram. No fundo os Elementos que formam o Mundo.
A associação desses elementos a animais foi a primeira forma de lhes dar uma representação, as aves que dominam os céus e o Ar, os peixes e outros animais marinhos, que representam a Água, os grandes animais terrestres que pela sua força ou ferocidade nos trazem agarrados à Terra. Já o fogo era mais difícil de ter uma representação zoomórfica e daí, talvez, ser associado ao mais elevado, representar o intangível, a força maior, a máxima purificação, o Espírito.
Em paralelo a estes cultos desenvolveu-se o culto da fecundidade, a representação do feminino, a adoração da Mãe. Da Mãe Terra, da Mãe Alimentadora, da Mãe Caridosa. Lembremo-nos das primeiras representações escultóricas, que nos trazem a imagem desses femininos, desses elos de ligação à Origem.
É, pois, a imagem de envolvimento, alimentação, proteção e ligação ao início, que é transmitida como culto do Feminino. E quando se fala do culto Feminino, Ísis surge naturalmente nas nossas mentes.
Ísis é tudo isso! Ísis é o Amor e a Fúria, é a Ternura e a Força, a Proteção e a Vingança e tudo isto se resume na imagem da Mãe a amamentar o filho.
Dando-lhe amor, ternura e proteção. Deixando a sua outra face de fúria e vingança, para quem ouse atacá-la ou ao seu filho.
Jean Iozia, questiona “Como explicar uma tal veneração por Ísis?”
Esta questão pode ter uma abordagem estritamente antropológica, mas também uma visão mais profunda em termos espirituais, místicos ou mesmo míticos, não forçosamente nesta sequência.
Já anteriormente se referiram algumas visões místicas da imagem da Mãe, estas visões são, em termos antropológicos, uma das bases da sociedade primitiva, que se manteve ao longo da História. Em grande parte das cosmogonias conhecidas existe a ideia da Mãe Terra, ideia essa que se espalha por vários continentes. Segundo Mircea Eliade (in, Mitos, Sonhos e Mistérios): “É a Terra Mater ou Tellus Mater, bem conhecida das religiões mediterrânicas, que faz nascer todos os seres”.
Este conceito associa-se frequentemente a uma ideia de origem resultante da união entre a Mãe Terra e o Pai Céu, com muitas variantes, mas tendo em todas elas um significado de origem e fim. Na origem os elementos base terra e/ou água são impregnados por elementos vindo do Céu ou do Sol e, recolhidos no seio da Terra, desenvolvendo-se no seu interior, fazendo crescer a vida, que irá brotar à superfície.
As cavernas são os úteros da Terra e a crença de que os humanos tenham sido gerados no seu interior é uma crença universal, criando uma relação umbilical, que após o seu corte, dá a liberdade ao homem para viver à superfície.
Podemos aqui fazer uma pequena extrapolação e juntar a esta visão uma evolução do plano físico para o plano intelectual e espiritual e pensar no seu paralelismo com a alegoria da caverna de Platão, a qual poderá representar o mesmo passo no sentido da gnose da humanidade.
Voltando à questão da ligação à Terra e à ideia de a ela se estar ligado no princípio e no fim, refira-se a tradição muito comum de “dar” o recém-nascido à terra, isto é de o colocar em contacto com a Terra Mãe para que ela o reconheça como seu filho, costume que persiste ainda nos nossos dias na Europa, Médio Oriente e Ásia. Aliás, em civilizações antigas o parto era realizado diretamente para o solo, e essa conexão era automática. A propósito disto Mircea Eliade refere que “Nos textos demóticos egípcios, a expressão “sentar-se na terra” significa “parir” ou “parto””. (a título informativo a escrita demótica, ou sekh shat para os egípcios, surgiu no início da 26o dinastia do Egito).
Ainda segundo esse autor, o sentido religioso desse costume prende-se com o conceito de que
“... a gestação e o parto são versões microcósmicas de um ato exemplar realizado pela Terra; as mães humanas não fazem mais que imitar e repetir esse ato primordial da aparição da Vida no seio da Terra...”.
Marcel Granet, nos seus estudos sociológicos sobre a China, menciona um paralelismo “O moribundo, tal como o nascituro é deposto sobre o solo”. Temos, pois, que a deposição no solo do recém-nascido e do falecido representa a saída e o retorno ao seio da Terra Mãe.
Neste sentido recorde-se que como referido atrás as cavernas eram o ponto de ligação ao seio da Terra Mãe e foi nas cavernas que foram enterrados os mortos durante muito tempo em muitos locais do mundo. As cavernas eram, assim, o ponto de emersão e imersão do Ser na sua Mãe, sendo que de forma idêntica as dádivas da terra, as suas rochas, os seus minérios eram tidos como “filhos” que emergiam para a luz e dádivas para o ser humano.
Há igualmente um certo paralelismo entre a saída do minério do interior da Terra e o nascimento. Relacionado com isto é de mencionar que em egípcio, a palavra “bí” pode ser traduzida por “galeria de uma mina”, mas também por “vagina”, dando assim este segundo sentido simbólico de ligação da Terra e do corpo feminino.
Mas o interior da terra é também considerado o forno, e o forno liga-nos à Alquimia e a “Alquimia inscreve-se no mesmo horizonte espiritual: o alquimista retoma e completa a obra da Natureza, enquanto trabalha para se “fazer” a si mesmo” (in, “Ferreiros e Alquimistas”) e assim temos mais um paralelo entre a imagem do seio da Terra e o Atanor, o forno cósmico, que simboliza assim, de outra forma, a Hierogamia Cósmica, o casamento entre o Céu e a Terra, como dizia Ésquilo “O santo Céu está inebriado por penetrar o corpo da Terra” e continuando, dizia que tudo o que existe – o Cosmos, os Deuses e a Vida- tiveram o seu nascimento originado nesse casamento.
Todas estas ideias e conceitos refletem-se no culto da Deusa Mãe, desde as culturas Paleolíticas e as suas Deusas nuas, passando pelas Deusas da Fertilidade dos povos agrícolas, até às Deusas caçadoras e guerreiras.
Podemos dizer que estas Deusas eram o poder do Mundo, uma vez que representavam o poder da Criação, por vezes apresentando certas características andróginas, podendo ser elas próprias, sozinhas, geradoras da vida. Este detalhe poderá ser importante quer na gestação de Ísis, quer na de Maria, se bem que revestido de outras componentes.
Continuando a seguir Mircea Eliade, a ideia da “...Terra Mãe[.] pertence à história das religiões [...]. Ora as estruturas religiosas são atemporais: não são necessariamente ligadas ao tempo.” E acrescenta “...a realidade religiosa é mais complexa: excede o plano histórico. O monoteísmo judaico não foi criação de um certo tipo de civilização; pelo contrário, alimentado pela experiência religiosa de uma elite, o monoteísmo judaico – como qualquer outro monoteísmo – viu-se obrigado a lutar contra as formas religiosas existentes.”
Assim, temos que o culto da Terra-Mãe, está associado à fecundidade, à criação e também à morte, obtendo aqui o valor da ressurreição ou do renascimento, muitas vezes implicando o sacrifício da própria Deusa, ou, em algumas civilizações, assumido como prática de louvor ou prece. “Poderia afirmar-se que a Terra-Mãe constitui uma “forma aberta”, susceptível de se enriquecer indefinidamente, e é por esse motivo que absorve todos os mitos que tratam da Vida e da Morte, da Criação e da geração, da sexualidade e dos sacrifícios voluntários.” (in, Mitos, Sonhos e Mistérios).
Chegados a este ponto, voltemos à questão de Jean Iozia, “Como explicar uma tal veneração por Ísis?”
A mitologia egípcia assenta num conjunto de mitologias passadas e os seus mistérios “... tratam da ação criadora, a Mãe Terra como geradora é simbolizada por Ísis. A Terra, impregnada pelos raios do Sol, produz o fruto, simbolizado na criança Hórus sentada ao colo de Ísis...” (in, As profecias da Pirâmide)
Esta representação corporiza um conceito e digamos, uma cosmogonia, já nesse momento ancestral, o culto de Ísis, cristalizou todo esse crer, todo esse sentir, transformou-se no arquétipo da Deusa, e como tal foi facilmente absorvida e entendida por todos. Menciona-se a citação de Iozia, referindo a aparição de Ísis a Lucius, onde a Deusa diz:
“As tuas preces tocaram-me, a mim, a mãe da natureza, a mestre dos elementos, a fonte primeira dos séculos, a maior das divindades, a rainha das sombras; eu que me confundo com os deuses e as deusas; eu, que o universo adorou sob mil formas a única e toda- poderosa divindade. Assim, nomeiam-me na Frígia, Cibele; em Atenas, Minerva; em Chipre, Vénus; em Creta, Diana; na Sicília, Prosérpina; em Eleusis, a antiga Ceres; em outros lugares Juno, Belone, Hecate, ou Némesis [e, acrescento eu, na Lusitânia, Atégina; para os Celtas, Dea Matrona, etc.], enquanto que os Egípcios, que na ciência precederam todos os outros povos, rendem-me homenagem sob o meu verdadeiro nome de deusa Ísis, Rainha.”
Temos, pois, assumido desde a antiguidade, o ecletismo e a universalidade de Ísis como modelo de todas as Deusas e também, de todas as Mães. Nela e na sua história encontramos todos os elementos atrás referidos, a candura, a força, a resistência, o sofrimento, o sacrifício, a fecundidade, a maternidade, a vingança.... Daí, talvez, a resposta à questão de Jean Iozia.
Citando José Sales e Rogério de Sousa (in, Reminiscências do Culto de Ísis): “Quando consideramos o legado da antiga civilização egípcia à cultura universal, é no campo das crenças, dos cultos e das divindades que a sua influência e repercussão se fazem sentir de forma mais indelével e durável. Levados por navegantes e comerciantes, os cultos dos deuses naturais do Egipto conheceram uma grande expansão, nomeadamente através da koiné helenística [a linguagem comum dos viajantes e comerciantes do mundo grego] que os propagou rapidamente pelo Mediterrâneo e, depois, pelo território do Império Romano, que acabou por os levar a zonas mais ou menos recônditas do império, vindo, por fim, alguns, a ser cristianizados sob nomenclatura do santoral cristão. A deusa Ísis foi uma dessas divindades e o seu culto um dos que inquestionavelmente maior sucesso conheceu praticamente até ao início da Idade Média europeia. Também no território que hoje é Portugal é possível identificar a presença de cultos dedicados a Ísis, nomeadamente em Bracara Augusta (Braga), Pax Julia (Beja), Aqua Flaviae (Chaves), Salacia (Alcácer do Sal), entre outros...” tais como no Outeiro e em alguns locais no Algarve.
Esta pequena citação daqueles autores, do trabalho mais profundo que lhe está associado, é mais uma pista da universalização (à escala do mundo antigo) e da dispersão geográfica do culto de Ísis, incorporando e refletindo o espírito mais antigo das diversas crenças locais.
José Sales e Rogério de Sousa refletem na forma como o culto de Ísis se Helenizou e posteriormente se Romanizou, alterando a sua representação iconográfica e chegando depois aos diversos cantos do Império Romano.
Segundo estes autores existe uma alteração de representação da imagem de Ísis, que ganha uma expressão “mais humana” com a qual vai conquistando mais devotos pelo mundo antigo. Usando as palavras deles: “As representações tradicionais de Ísis com o menino vão
progressivamente sendo afeiçoadas e de uma relação fria, indiferente, hierática e distante entre mãe e filho vai chegar-se a situações de enorme comunicação e afeto entre ambos.”
A evolução do culto propriamente dito e da sua iconografia, não é uma simples alteração da imagem para representar “novos deuses”, mas sim uma continuidade que circulou, como princípio, que que se revestiu de acordo com costumes locais e se foi densificando enquanto estrutura de rito e devoção.
Assim, enquanto nos muros das capelas laterais da Sé de Braga, erigida sobre um Templo de Ísis, encontramos uma dedicatória do século II, exatamente dirigida a Ísis Augusta, da autoria de uma sacerdotisa do culto imperial do conventus de Bracara Augusta chamada Lucrecia Fida, vemos, em paralelo, no Egipto, já com um novo enquadramento religioso, mas mantendo a mesma imagética, representações de Ísis do período Copta (3o sec. dC) e um túmulo egípcio datado do séc 5o-6o dC com uma representação semelhante de Maria e Jesus.
É desta fusão que surgem um conjunto de imagens da Virgem amamentando o Menino, que seguem cânones semelhantes às representações de Ísis. Algumas fontes referem uma possível influência dos Cruzados (alguns séculos mais tarde) na divulgação (ou reintrodução) deste culto e na dispersão destas imagens de dimensão reduzida, que são o fio condutor de um culto materno que nos liga desde a Mãe Terra, até a uma religiosidade mais elaborada e complexa, de que se revestiu uma parte importante do Cristianismo (e também do Islamismo...), que é o culto Mariano.
Fulcanelli, no seu livro “Os Mistérios das Catedrais” refere “Outrora, as câmaras subterrâneas dos templos serviam de morada às estátuas de Ísis, que se transformaram, quando se introduziu o Cristianismo na Gália, nessas Virgens Negras que o povo dos nossos dias rodeia de uma veneração muito particular. O seu simbolismo é, aliás, idêntico; umas e outras mostram, no seu pedestal, a famosa inscrição: Virgini partiturae, à Virgem que deve parir.”
E acrescenta este autor que, já Bigarne em 1862 citava uma outra inscrição, mais antiga, que dizia: “Isidi, seu Virgini ex qua fillius proditurus est” (A Ísis ou à Virgem, de quem o Filho nascerá).
Rolando Van Zeller, no seu artigo “As possíveis Virgens Negras Portuguesas”, refere que Jacques Huynen considera que uma Virgem Negra tem treze características fundamentais, das quais se podem referir as seguintes:
“- São Virgens de Majestade, isto é, assentadas num pequeno escabelo sem costas, com o Menino repousando no regaço e nunca nos joelhos.
- O rosto da Virgem não indica ternura ou compaixão, mas sim um ar de soberania hierática, com aspecto oriental e, segundo uns, com expressão faraónica.
- Algumas imagens são verdadeiras obras de arte, outras muito grosseiras; mas em todas o tratamento das feições da Virgem são muito mais cuidadas do que as do Menino como que chamando a atenção para a importância primordial da Virgem.
- Os santuários onde estão colocadas são sempre locais muito frequentados desde a mais alta antiguidade e onde existiu um culto de divindade pagã.
- Encontra-se sempre um elemento oriental ligado ao culto, como, por exemplo, «que foi um cruzado que trouxe a imagem ou que foi oferta de algum emir árabe».
- O local onde se venera a Virgem foi sempre lugar de peregrinações, .... Verifica-se também que [poderá estar] relacionado com Abadias Beneditinas, Cistercienses ou Templárias.
- Caso ainda existam vestígios de antigos edifícios ou igrejas, encontram-se sempre sinais com aspecto esotérico ou iniciático reflectindo-se nas lendas e milagres do local.
- As promessas e oferendas nada têm que ver, à primeira vista, que se relacione com o culto católico. São ofertas de rodas de cera, vinho, colocação de doentes sobre pedras, queima de círios de cor verde, telhas destacadas de telhados da igreja, etc.”
Essas imagens chegaram até nós por diversas vias, estando, em muitos casos associados a aparecimentos mais ou menos misteriosos, desde terem sido encontradas em grutas, até a boiar em rios.
Só em França foram referenciadas cerca de 300 destas imagens, das quais 150 chegaram intactas aos nossos dias, tendo sido algumas delas integradas em construções religiosas, caso das imagens existentes nas catedrais de Chartres ou Marselha.
Mas em muitos outros lugares na Europa e da América do Sul, está referenciada a existência de Virgens Negras, como, por exemplo para citar algumas das mais conhecidas, a de Mont Serrat, a Na Sra de Guadalupe de Cáceres, a Virgen de la Peña em Salamanca (Espanha), a de Na Sra de Vilvoorde (Bélgica) e a Czestochova (Polónia), ou outras de origem mais tardia, de período pós-renascentistas, como a Nossa Senhora de Guadalupe no México e Nossa Senhora Aparecida no Brasil, ambas fundamentais no culto Mariano daqueles países, tendo sido, inclusive, a Nossa Senhora Aparecida proclamada a Padroeira do Brasil.
No texto de Ronaldo Van Zeller, já citado, são indicadas várias Virgens Negras que se veneram em Portugal, curiosamente e segundo refere o autor em nenhum dos locais atrás citados como tendo existido o culto de Ísis, há memória de ter existido um culto a uma Virgem Negra. A explicação apontada para o facto prende-se com as guerras de conquista e reconquista árabe, que levavam muitas vezes à destruição dos lugares de culto, “daí que nas lendas há sempre referência a estátuas da Virgem escondidas em grutas, ou árvores, com a aproximação dos exércitos invasores”, o que poderá explicar igualmente alguns dos aparecimentos “misteriosos” de imagens, ocorridos séculos mais tarde.
Dos vários locais e imagens de culto da Virgem Negra no nosso país, destaca-se a Senhora da Nazaré, conhecida desde o início da nacionalidade, e a quem é atribuído o milagre de salvamento do Cavaleiro Templário D. Fuas Roupinho.
Para além desta temos referências à existência destas Virgens Negras em Lisboa, Pederneira, Porto, Lamego, Moncorvo, Baságueda (na Beira Baixa), Cárquere (Viseu), Senhora da Lapa e Guimarães.
Cada uma destas imagens e locais compõe uma rede em que o culto se expandiu, já não com a ligação esotérica que estas Virgens comunicavam quase que em primeira mão, mas assentando numa cristianização da imagem, algumas delas transformadas na “Senhora do Leite” como a que existe em Braga, e recorde-se que, sendo certa a existência do culto de Ísis nessa cidade, não há referência a qualquer Virgem Negra, ocupando esta Virgem do Leite o seu lugar nas intenções dos devotos.
De referir ainda brevemente duas associações a esta matéria. A primeira tem a ver com o culto de Sta Sara, a Padroeira do Povo Cigano, representada sempre com tom escuro, evocada por vezes com associação a Kali e, segundo a lenda, filha de Jesus e Maria Madalena. Havendo igualmente a referência de que é muito comum, nos locais onde existem Virgens Negras, existir igualmente a imagem de Madalena.
Quanto à segunda, permito-me a fazer uma leitura das imagens da Pieta, no geral numa postura semelhante e com Jesus sacrificado nos braços, a retornar à Mãe, já não a Mãe criadora, ou alimentadora, nem a Mãe protetora, mas a Mãe que se sacrifica, através do filho, para que haja um Renascimento. E por muitas imagens da Pieta que existam, chegamos sempre à de Miguel Ângelo, no Vaticano.
Essa imagem não foi a única de Miguel Ângelo esculpiu ou autorizou que se reproduzisse sob os canônes por ele criado. Um seu assistente, Raffaello da Montelupo, fez uma reprodução em Bronze, com a concordância do Mestre, que é conhecida
como a “Pieta Negra de Michelangelo”, e está na Igreja de Sto André do Vale, em Roma.
Temos, pois, resumindo, uma linha de culto desde a antiguidade até aos nossos dias que enquadra o Sagrado Feminino e o foca na Deusa Ísis, com os seus Mistérios, esotéricos e reservados aos seus Iniciados. Essa imagem, e alguns dos mistérios a ela associados, migram com as civilizações e retornam através de cultos cristianizados e “encarnam” nas imagens e virtudes de Maria, dando origem a um culto dentro do culto.
Para a Maçonaria, a simbologia de toda esta linha de conhecimento, reflete-se, por fim, na ligação de cada um de nós ao “Um”, através da via que fazemos, desde a unidade inicial, até a ele retornar, no Amenti. Um caminho, do nascimento ao fim, em que a Deusa Mãe, Ísis, nas suas diversas representações, concebe, alimenta protege e recebe.
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Bibliografia:
Eliade, Mircea – Mitos, Sonhos e Mistérios – Edições 70, Lisboa
Fulcanelli – O Mistério das Catedrais – Edições 70, Lisboa
Iozia, Jean – La Franc-Maçonerie Egyptienne au Grand Orient de France – EDIMAF, 2002, Paris Toth, Max – As Profecias das Pirâmides - Círculo de Leitores,1983, Lisboa
Sales,J.C. e Sousa, R.F. – Reminiscência do Culto de Ísis no Território Português: O caso de Braga (Bracara Augusta) – in, Gil Vicente, Revista de Cultura e Atualidades (no 4, IV Série), Ed. Cidade Berço, 2003, Guimarães
Zeller, Rolando Van - As Possíveis Virgens Negras Portuguesas - CONGRESSO HISTÓRICO DE GUIMARÃES E SUA COLEGIADA – Actas Vol. IV Comunicações, 1981, Guimarães
Bibliografia on-line:
Carvalho, António A.M. - Virgem Negra, Maria Madalena e Nossa Senhora da Conceição. A continuidade de um culto pagão – ACAFA on-line, no 4, 2011, Vila Velha de Rodão https://www.altotejo.org/acafa/docsn4/Virgem_Negra_Maria_Madalena_N_S_Conceicao.pdf
F.B.M.C. Sociedade Rosa-Cruz - A Virgem Negra da Nazaré – Viagens Filosóficas (2018) http://www.rosacruz.pt/auditorio/index.php/165-filosofia-1/515-a-virgem-negra-da-nazare-2
Rodrigues, J.A. – A Maçonaria e o Sagrado Feminino – Freemason – 2018 https://www.freemason.pt/a- maconaria-e-o-sagrado-feminino/